Durval Cristóvão: “O Canal Tapacurá quer exibir a cidade.”.
(Foto de Artur Carvalho)
Quando Conheci Durval, nós éramos
adolescentes. Ele interpretava poemas e cantava as próprias canções no
espetáculo Adega Vazia. Nessa época, a produção musical e teatral em Vitória de
Santo Antão era intensa. Durval cresceu e foi estudar teatro e filosofia.
Apesar de dialogar com outras expressões artísticas, ele faz questão de ser
reconhecido como um “homem de teatro”. Leonino por natureza, Durval irradia
energia e força criativa. Com o objetivo de divulgar a primeira websérie
realizada em Vitória de Santo Antão, produzida pelo Canal Tapacurá, fui ter com
ele uma conversa bacana.
[MATACULTURAL]
O Canal Tapacurá surgiu em 2016. Qual a pretensão de vocês?
[DURVAL CRISTÓVÃO] A palavra
pretensão é delicada, afetada e perigosa. Evito praticar futurologia. Gosto de
pensar no que a gente está fazendo. No agora, o futuro e o passado estão
presentes. O Canal Tapacurá quer exibir a cidade. Hoje, estamos mais maduros,
conscientes do papel que desempenhamos. Ter a comunidade reunida é um desejo
antigo. A internet, paradoxalmente, nos aproxima e nos distancia. O Canal tem
nos propiciado muitos encontros virtuais, mas as relações virtuais não matam a
nossa fome e a nossa sede de gente. Queremos a pele, o olhar, o calor das
pessoas. Talvez esta seja a nossa pretensão: reunir pessoas, democratizar o
acesso à tecnologia e aos meios de produção. Por isso, há mais de um ano
realizamos oficinas nesta cidade. Agora, nós somos uma Escola Livre de Produção
Audiovisual. VIRA BICHO, websérie que está em fase de pré-produção, é a menina
dos nossos olhos. Como funciona a Escola? Durante os ensaios de Vira Bicho,
distribuímos tarefas específicas para cada colaborador. Na prática, cada grupo
(núcleo) vai descobrindo a melhor maneira de dar conta dos desafios que lhes
foram atribuídos. Pouco a pouco vamos descobrindo a melhor maneira de realizar
o nosso projeto.
[MATACULTURAL]
Agora, em 2018, o Canal produziu um documentário, 'Vira Bicho', que obteve mais
de 25 mil visualizações. Por que essas histórias bizarras rendem tanta
audiência?
[DURVAL CRISTÓVÃO] Quando eu era
adolescente, acompanhava a programação da TV Cultura. Um comercial ficou
guardado em minha memória, ele dizia assim: “Quando a realidade ultrapassa a
ficção, é hora de fazer documentário.” Era uma chamada para novos realizadores.
Eu sempre gostei do gênero, dizia para mim: “se um dia eu fizer cinema, serei
documentarista”. Não quer dizer que eu faço cinema, por enquanto, nem tenho
essa pretensão. Eu sou do teatro, faço isso desde criança. Quando me perguntam
o que estou fazendo, gosto de dizer: eu faço internet. Vira Bicho nasceu de uma
conversa no Facebook, de uma brincadeira. Recentemente, a imagem de um animal
medonho viralizou na internet e atiçou a imaginação dos moradores da Vitória de
Santo Antão. A equipe do Canal Tapacurá foi às ruas entrevistar alguns
moradores de diferentes localidades da cidade, com o objetivo de produzir um
falso documentário intitulado Vira Bicho. Surpreendidos com a riqueza e a
diversidade dos depoimentos colhidos em diversos bairros da cidade, a equipe
decidiu ampliar o projeto e criar uma série ficcional para internet. Desde o
começo do mundo, monstruosas formações antropomórficas aterrorizam a criatura
humana. Lobisomens, vampiros, demônios e feras assassinas povoam o imaginário
popular e servem de inspiração para filmes de terror e de suspense. O roteiro
do falso documentário foi escrito por Arthur Carvalho, Sâmmia Gonçalves e eu.
Planejamos as gravações um dia antes de filmar. Na rua, descobrimos histórias maravilhosas.
Não podíamos parar por aí, queríamos mais, muito mais! Pensamos: por que não
fazermos uma websérie? Criamos para o Canal um selo chamado Chorume. É por ele
que vamos escoar toda a nossa produção ficcional. Eu já tinha muito material
guardado: fotos, referências, muitas coisas. Eu tenho interesse pelo horror,
pelo erótico, pelo pornográfico. Eu já tinha o rascunho do roteiro da websérie
pronto há mais de um ano. A websérie tinha outro título, mas a ideia era
muito parecida. Fiz algumas alterações no rascunho que eu tinha, escrevi o
argumento da websérie e fui conversar com Arthur Carvalho, o meu
parceiro de criação. Arthur disse: “Sim! Vamos fazer isso!”. Depois do “sim” de
Arthur, comecei a montar a equipe e a finalizar o roteiro. O projeto cresceu
bastante. Já estamos bem encaminhados e eu estou muito feliz com os resultados.
Na série, todo mundo tem a sua hora. Qualquer um pode virar bicho. Acho que é
isso. A linha que divide a fantasia da realidade não é clara, e nós vivemos
sobre ela. “Essa linha tem estado irremediavelmente embaçada”, acho que quem
disse isso foi Roman Polanski.
[MATACULTURAL]
Quem faz parte do elenco/produção?
[DURVAL CRISTÓVÃO] Nós temos um
elenco grande. Vamos lá! Vou tentar lembrar de todo mundo. Eu escrevi o
roteiro, ajudo na produção e faço a direção da websérie. Arthur Carvalho
faz a fotografia, ajuda na produção, filma, edita e atua. Ufa! Sabe o que é
pior? Ele faz bem tudo isso. Pablo Dantas atua e faz produção. Karlla Dayanne
comanda uma das câmeras, Karlla é fotógrafa e videomaker. A gente se
vira fazendo mil coisas. Aos poucos, estamos delegando parte das nossas
funções, sempre que chega alguém interessado em ajudar, a gente vai
distribuindo tarefas. Ninguém quer acumular funções. Não dá pra fazer tudo isso
com maestria. Arthur Couto faz a assistência de direção, bate a claquete e
cuida da continuidade. Débora Bittencourt faz o som direto, também é fotógrafa.
Débora é estudante de cinema. Vitor Colaço colabora na produção-executiva e
também dá uma força na captação de áudio. Beatriz Monteiro faz assistência de
produção. Edson Ribeiro faz produção-executiva. O elenco é numeroso: Rildo de
Deus (Josué Batista), Sâmmia Gonçalves (Maria Goretti), Pablo Dantas (Amaury
Xavier), José Bezerra (Pata de Cachorro), Pedro Henryque (Delírio), Mergulha e Voa (Irmã Zezinha), Marcos Haas
(Lili), Márcio Guga (Beto da Burra), Luann Ribeiro (Carlos do Chiqueiro),
Elimar Vitalino (Biu Doido), Josivel Gaspar (Pedro), Kelryn Lainym (Karol), Day
Batista (Soraya), Kleber de Oliveira (Vira Bicha) e Evandro Lira (Pimenta).
Você me colocou em uma situação difícil. Estou com medo de ter esquecido
alguém. Tem mais personagens na trama, mas ainda estamos fechando o elenco. As
gravações começam em Junho. Espero não ter esquecido de nenhum nome. Você faz
parte da produção, me ajude!
[MATACULTURAL]
A produção cultural independente de Vitória existe porque levanta a bandeira
libertária ou porque, desorganizada, não almeja políticas públicas?
[DURVAL CRISTÓVÃO] Nós não somos
desorganizados. Não dá pra reunir tanta gente e ser desorganizado. A cidade já
tem um trabalho consistente realizado pelo pessoal do Cineclube Avalovara. Eles
estão há mais de cinco anos lutando. A proposta do Cineclube é um pouco
diferente, mas a luta é a mesma. Nós, do Canal Tapacurá, somos criadores de
conteúdo para internet. Não temos políticas públicas para requerer algum
financiamento nesta cidade. O Conselho de Cultura foi aprovado na gestão
passada, mas nunca funcionou em gestão nenhuma. O que você espera que eu faça? Vá
ao balcão da prefeitura pedir esmolas ao Governo? Isso não combina conosco.
Sempre realizamos nossos projetos sem precisar de politicagem e nem dos favores
de certos coronéis disfarçados de mecenas, que nos dão algumas moedas de cobre
e em troca exigem respeito e reverência. Nossos espectadores estão nos
apoiando. Eles pagarão os custos da série. Estamos vendendo camisas,
acessórios, livros… Não aceitamos ajuda de políticos. Um vereador não deve
bancar obra nenhuma, muito menos um prefeito. Queremos conversar com as
instituições, queremos políticas públicas. Se houvesse um meio legal de
conseguir apoio da prefeitura, nós aceitaríamos. Mas não queremos nos submeter
a política de balcão. A série faz duras críticas a isso. Eu tinha uma esperança
infantil que o Conselho de Cultura fosse mudar alguma coisa, mas o Conselho
está morto! Ninguém sabe dizer nada sobre ele. Nem os próprios conselheiros.
[MATACULTURAL]
Você postou no Facebook que a produção do 'Vira Bicho' é "uma boa
oportunidade para reunir os amigos". Caso consiga um patrocínio de 1
milhão de reais, a amizade continua?
[DURVAL CRISTÓVÃO] Se eu conseguir
um milhão de reais, reúno até os meus inimigos.
[MATACULTURAL]
Como as pessoas podem colaborar com a produção dessa websérie?
[DURVAL CRISTÓVÃO] Comprando os
nossos produtos, comparecendo aos nossos ensaios, divulgando as nossas peças
publicitárias, curtindo o nosso canal e nos seguindo nas redes sociais
(Instagram, Facebook e YouTube).
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